21 June 2012 English translation Sobre o Caminhar Yi-Fu Tuan
O caminhar, até onde eu sei, não é muito valorizado na cultura chinesa. Foi, e é visto como um meio de ir de A para B. Nos velhos tempos, os funcionários daquele Estado eram carregados em liteiras ou, se fossem militares, andavam a cavalo. Meu pai era chefe de protocolo do Ministério das Relações Exteriores chinês nos últimos anos da década de 1930. Seu trabalho era o de acompanhar um recém-nomeado embaixador estrangeiro até a residência do presidente da China, onde este apresentaria suas credenciais e as de seu pessoal. O presidente chinês, Lin Sen, vivia numa montanha e o único acesso a sua residência era um caminho estreito e sinuoso. Papai havia cuidado de trazer algumas liteiras e condutores para levar os dignitários até o alto da montanha. Infelizmente, para ele, o embaixador soviético se recusou a ser levado sobre os ombros de seres humanos. Como ele insistiu em caminhar, papai e outros funcionários chineses também tiveram que subir a pé. Posso imaginá-los transpirando e sussurando uns com os outros acerca da rudeza dos bárbaros. O embaixador soviético pode ter pensado que devia seu desejo de caminhar à ideologia Marxista. Na verdade, este desejo é mais profundo que isso. O caminhar está profundamente arraigado na civilização Ocidental, remontando aos romanos (veja-se Timothy M. O'Sullivan, 'Walking in Roman Culture', 2011). Para os antigos romanos, o caminhar - como cada um caminhava - era uma marca de personalidade e da posição social. Escravos caminhavam rapidamente; de fato, eles praticamente corriam. Homens de estatura aspiravam a transparecer um ritmo imponente. Não deveria ser muito lento, pois a lentidão marcava as mulher e os afeminados. Bastante justo enquanto etiqueta, mas os bárbaros - Espanhóis, em particular - questionavam, para que os romanos caminhavam? Por que os generais romanos desandavam a caminhar no campo de batalha? Resposta: para demonstrar uma elevação mental condizente à seriedade do colóquio que seria encetado, hábito adquirido por eles quando civis. Pórticos eram uma parte intrínseca da arquitetura doméstica romana, cuja finalidade era a de fornecer sombra para o caminhar. Antes dos romanos, os atenienses também valorizaram o caminhar, mas apenas na medida em que este promovia o pensar. Toda uma escola de pensamento, a escola "peripatética" de Aristóteles, foi nomeada a partir do caminhar (peripatein "passear"). Caracteristicamente, Thales, o sábio grego, enquanto vagava perdido em seus próprios pensamentos, caiu num poço. Para os gregos, pensar era efetivamente mais importante do que caminhar, este último sendo apenas o meio, o primeiro, o fim. Para os romanos, o caminhar tinha valor em si mesmo. As elites da Europa moderna são mais romanas que gregas. Fico impressionado pela forma como eles amam o caminhar. Talvez eu devesse limitar a minha observação apenas aos membros da classe governante inglesa que cobrem todos os dias de 16 a 32 quilômetros de estrada rurais como uma questão de disciplina. Para que propósito? Eles teriam achado a pergunta impertinente, mas, se pressionados, podiam dizer que é uma marca de caráter e formadora de caráteres. E se pressionados mais, eles poderiam dizer que o império britânico foi conquistado tanto nas bem conhecidas estradas rurais inglesas quanto nos campos de jogos de Eton. Para o devoto verdadeiro, o caminhar não apenas desobstrói o pensamento, mas também os fluidos corporais, promovendo, desta maneira, o bem-estar físico. O filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard certamente pensava assim. Numa carta para um amigo, datada de 1847, ele escreveu: "Acima de tudo, não perca o seu desejo de caminhar: todos os dias eu caminho sozinho num estado de bem-estar e me afasto de todas as enfermidades; eu tenho caminhado sozinho para meus melhores pensamentos, e não sei de pensamento tão pesado que não consiga me afastar dele. Por outro lado, quanto mais se fica parado, mais perto fica de se sentir doente. Assim, continua a caminhar, que todas as coisas irão ficar bem." Todas as práticas meditativas recomendam, no entanto, o oposto. O guru senta de pernas cruzadas, perfeitamente imóvel. Buda é invariavelmente retratado sentado, olhos fechados, imóvel. E, no entanto, sua última palavra para seus discípulos foi "Caminhem!" Yi-Fu Tuan
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